A poesia é um rio que corre em mim, sempre em busca de suas nascentes.

O corvo



Um corvo pousou em minha mão
Confortável como se vigiasse uma lápide
Depois de uma longa conversa, em silêncio.
Descobri ser a personificação da solidão.

Satisfez-me, satisfaz-me, desfez-me, desfaz-me.
Ceou em meus pensamentos, bicando as feridas.
Não me machucou, mas devorou tudo o que tinha.
Descobri ser um necrófago com aparato cognitivo.
Guiou-me pela inocuidade de meu mal.
Através de seus olhos negros, a clareza se expandia.
Acompanhou-me pelo abismo, enquanto eu caía.
De nada adiantam asas, quando não há pousadouro.

O sol nasceu; ele partiu deixando fezes em minhas mãos.
— Os corvos têm a capacidade de reconhecer velhos amigos —
Foi levando consigo uma parte de minha solidão.
Mas, ao anoitecer, regressará, em seu imperativo místico.

Eu vejo um corvo ao me olhar!
Eu vejo um corvo em meu olhar!